terça-feira, agosto 1

Gratidão com a vida

Há alturas em que nos sentimos muito infelizes com os acontecimentos da nossa vida. Eternamente insatisfeitos. Outras há em que até nos corre tudo bem, mas ainda não o suficiente para nós. E nesta treta do "ainda não tenho" e do "tenho alguma coisa, mas ainda não tenho tudo" vamos desperdiçando o tempo e sendo ingratos com a vida.

Uma amiga minha hoje dizia-me: "Temos de nos mostrar gratos com a vida para que ela nos dê aquilo que realmente merecemos. Senão ela tira-nos os flashes de luz que é suposto sabermos aproveitar e que estamos a ignorar por completo." Eu dei-lhe (e dou-lhe) toda a razão. Mesmo que as relações acabem, mesmo que os empregos se percam, mesmo que a vida dê 3 ou 4 cambalhotas e vire o nosso mundo do avesso... O importante é perceber que cada coisa tem uma razão de existir e está aí para a aproveitarmos. Além do mais, se queremos uma vida cheia de coisas boas há que fazer por isso. E o primeiro passo é agradecer quem somos hoje, o que temos e o que, graças a isso, podemos fazer das nossas vidas. Obrigada, vida, por tudo aquilo que tenho agora...

2 comentários:

Anónimo disse...

"O importante é perceber que cada coisa tem uma razão de existir".
Embora possa concordar com parte do teu texto, gostava de saber mais sobre o que queres dizer com esta em particular.

Ao dizeres que "cada coisa tem uma razão de existir" pareces admitir que pende sobre as nossas vidas uma predestinação ou qualquer outro sucedâneo pós-moderno dela. Será que necessitamos que isto tudo tenha um sentido para lutarmos? Parece-me, antes, tudo muito menos romântico e muito mais divertido. Talvez não necessitemos de mais razões para continuar do que termos inscritas no nosso código genético as regras da sobrevivência. Pensar que "cada coisa tem uma razão de existir", perdoa-me a opinião, parece-me um rasgo ingénuo, saído da bolha de tédio existencial das sociedades ocidentais contemporâneas, que permitem esse tipo de devaneios, longe de verdadeiros problemas que colocam o ser humano nas fronteiras da sobrevivência.

Para cada coisa ter uma razão de existir numa perspectiva relacional com o nosso destino (será que isto existe?), teríamos de admitir algo parecido com uma superioridade daqueles para quem o “existir” está pejado de boas “razões” e algo menos do que uma existência insignificante para todos os que parecem deixar de existir sem nenhuma razão. Exemplo: como explicar a uma criança libanesa de 5 anos que se o tecto da sala, onde todos os sábados e domingos de manhã vê os desenhos animados, lhe cair em cima, isso tem uma “razão” de ser. E que, mesmo que só tenha vivido até aos 5, “o importante é perceber que cada coisa tem uma razão de existir”.

Mesmo que a sua vida tivesse sido tolhida em favor de uma causa estratégica (Israelita, Palestiniana, etc) que fosse tornar a vida de outra pessoa mais fácil noutra parte do mundo, teríamos de admitir que há vidas mais importantes do que outras. Neste caso, que a da criança de 5 anos teria menos valor do que todas aquelas vidas que se iriam tornar melhores pelos efeitos estratégicos da sua morte.

Esta é uma lógica, que me parece algo distorcida, e enferma da forma de olharmos para o resto do mundo de um modo algo leviana, no mesmo registo em que da escolha de da caixa de pagamento num supermercado vazio.

As próprias “lógicas” dos diversos credos religiosos parecem fugir a este tipo de predestinação, pelo menos na sua essência, embora as hierarquias gostem deste tipo de instrumentalização: é mais fácil lidar com pessoas conformadas, e pensar que está tudo previsto, é mais forte que qualquer tipo de inconformismo.

Se deus ou Deus, ou os d(D)euses, ou qualquer outra entidade superior, que necessariamente tens de admitir para acreditar que tudo tem um sentido intrínseco, estão mesmo por aí, ou tratam-se de divindades romanas embriagadas, ou têm/tem um mau gosto de terrível em prover de más razões de existir os mais fracos.

Quanto à história do livre arbítrio, quase sempre evocada para justificar a nossa margem de manobra em relação à predestinação. Já não cola para justificar o silencio de uma entidade suprema calada e é completamente incompatível com tudo ter uma razão de ser.

Acho que estamos sozinhos com as nossas decisões. Parece-me mais sensato aprender a viver com isso do que com as balelas de revistas cor-de-rosa.

Atentamente

Um anónimo na Internet

blackpanther disse...

Muito obrigada pelo comentário :). Sempre me interroguei muito sobre qual seria a razão de haver pessoas no mundo a morrer de fome e outras com vidas supremas (se bem que duvido disto, mas materialmente falando). À luz do "tudo tem uma razão de existir", teria de falar de coisas tão transcendentes como karma pessoal e individual e essas "tretas estranhas" nas quais até acredito. Recuso-me a acreditar que a vida é só isto e que se resume a estar aqui e sobreviver. Para mim, o acaso não faz sentido. Tudo o que me acontece eu interpreto como uma forma de me estar a ser dito (não interessa por quem, nem quero saber) que o melhor caminho a seguir não é aquele. É altura de ir por outro lado. No entanto, foi preciso ir por ali porque tinha algo a aprender. Quanto mais não seja, aprendi que por ali não quero (ou não devo) ir mesmo. E considero sempre que tenho a liberdade de insistir no erro e na estupidez ou de optar por seguir um outro caminho. Ou seja, acabo por não ter uma resposta científica para o que perguntas. Nem quero provar nada ou ter razão. Isto, para mim, é apenas um desabafo de algo muito pessoal que faz todo o sentido e consigo comprová-lo no meu dia-a-dia. Não posso salvar as crianças do Líbano ou matar-lhes a fome. Mas se uma criança me aparecer pela frente na minha Lisboa, onde me movo, nunca a ignoro e dou-lhe o que ela precisa. É, talvez, o sinal de que não podemos mudar o mundo, mas podemos melhorar qualquer coisita ao agirmos de imediato sobre o que se passa à nossa volta. E, até aí, temos uma escolha. E não é por falta de oportunidades. Pode ser por falta de atenção ou mesmo desprezo, mas os "sinais" tão lá ;).